Feirinha do Zona Sul
Quantas
vezes, principalmente nas noites de sábado, quando o garoto saía para as
festinhas, lá vinha a recomendação do pai: – Tá levando a camisinha? Vê lá,
hein? “A coisa está preta”, “o mar não está para peixe” e outros ditados inerentes
à situação.
Com
seus dezenove anos, lá ia o garoto, com a sexualidade à flor da pele, disposta
a ser gasta quantas vezes quisesse naquela noite, para confirmar uma
constatação: que a juventude, realmente, era a melhor coisa da vida!
Enquanto
o garoto saía para as festinhas, na sala, do “sala e dois quartos”, o pai via
TV; a mãe preparava uns canapés e trazia o vinho geladinho, eleito para ser
saboreado enquanto o filme do Telecine fosse passando.
Nesse
mormaço de vida rotineira, seguia o casal. Ele com 60 e ela com 50. Na verdade,
casaram um pouco tarde, depois de aproveitar muito bem seu solteirismo. Vinte e
cinco anos de casamento! Bodas de prata! Um filho único, maravilhoso. Muito bom
caráter, amoroso, estudioso... O quê desejar mais?
Quem
sabe os dois, agora sentados diante da TV, tivessem, naquele momento, o mesmo
pensamento. E assim ficaram. Mãos dadas e olhos na telinha!
Mas...
sempre há um mas!!! E este surgiu quando ele, fazendo a feirinha das
terças-feiras, ao tocar no último papaia da prateleira, outra mão tocou também
a fruta. Um pedido de desculpa... e quem levou o mamão? A bela loira que ao seu
lado sorria. E sobre mamões foi o primeiro diálogo. Ela, fanática por regime!
Ele, nem tanto! O certo é que, sempre naquele horário, todas as terças, o
encontro se repetia. Quando o diálogo saiu do tradicional comentário sobre a
excelência das melancias, abacates e limões, mudou para uma cervejinha. E a
tomada da mesma foi marcada para aquela tarde, no quiosque perto da Gláucio
Gil. E muitas caixas de cerveja foram consumidas no decorrer dos dias. Agora
ele, que não ligava muito para a aparência, já fazia a barba, cabelo e até se
perfumava para ir à feirinha. Sua mulher observou a diferença, pelo olfato, é
claro! Até que...! Sempre tem um até que!
Até
que o encontro foi marcado para a visita a um motel. E teria que ser no período
da tarde. Não convinha duvidar da inteligência de sua esposa. A desculpa foi a
renovação, com presença obrigatória, do seguro do carro, na Presidente Vargas.
Ao chegar à portaria do prédio, encontrou com o filho, que chegava do colégio
para almoçar. Quando o garoto viu o pai nos trinques, deu-lhe uma bela gozada:
– “Olha o coroa! Tá com tudo em cima, hein? Barba bem feita, camisa nova...” E,
rindo, na entrada do elevador, soltou a última gracinha, antes de subir: – “Não
esquece a camisinha, pai!”
A
frase – “será que este garoto sabe tudo?” – foi logo dissipada, pela análise de
que tudo tinha sido tramado na mais absoluta discrição. Foi à farmácia e
comprou dois pacotes de três preservativos, aproveitando a promoção e, porque
não, o seu otimismo!
Mas
tarde, no motel escolhido previamente, dois corpos nus. Olhando para o teto
totalmente espelhado, aguardavam o desbloqueio da inibição provocada pela
primeira traição e pela rejeição ao uso da camisinha. E quanto mais tentavam,
mais distantes ficavam as possibilidades daquilo não ser a brochada do ano.
–
“Isso acontece nas melhores famílias!” – foi a frase que ela escolheu para
aliviar o sofrimento do infeliz.
Chegou
em casa completamente fracassado. Na cozinha, encontrou a mulher, que lhe
perguntou sobre o seguro.
Completamente
distante dali, respondeu: – “Sexo seguro?”
–
“Não, homem de Deus! Seguro do carro!”
–
“Ah, foi renovado.” E, sentindo-se culpado por ter mentido, foi tomar um banho.
Naquela
noite, ele a mulher voltaram a ser meninos.
E
fizeram – coisa rara – duas vezes amor, naquela madrugada! Na verdade, todo o
fogo que faltou no motel, se acendeu no quarto do “sala e quarto” em que
moravam.
Depois,
enquanto se cobria para dormir, ela, com um sorriso matreiro de quem sabia de
tudo, falou: – “Querido, bota o despertador pras nove horas que amanhã tem a
feirinha do Zona Sul!”