Na minha infância, as
férias duravam quase três meses. Já na vida adulta, me satisfaço com algumas
semanas em que consigo escapar de tantos compromissos. Cinema acompanha a
tendência. Antes, era quase um cinéfilo, frequentava os espaços culturais, as
semanas temáticas, ciclos de diretores, cinema polonês, russo e alemão. Hoje,
me defendo com algumas coleções de vídeos que alguns grandes jornais organizam.
Mas a tela plana nunca pode replicar o ambiente que só uma sala de cinema
representa. No verão, então, aquele calor africano do lado de fora e aquele
friozinho escandinavo da sala fazendo o contraste, é uma delícia.
Em dois dias, dois
filmes, dois gêneros e duas escolas. Uma mostra pequena, mas que pode expor uma
tendência: o cinema brasileiro está melhorando. De um lado um peso pesado:
"O Hobbit, uma aventura inesperada", 470 milhões de dólares de
orçamento, toda a fama dos escritores, equipes milionárias de Hollywood e...
uma narrativa sem a menor novidade, personagens batidos, clichês, e sequências
intermináveis de efeitos especiais. Não consegui dar sequer uma risada. Só
mesmo do ridículo de algumas cenas e do fato que o "feiticeiro
castanho" teria debaixo do chapéu um ninho ativo, e deste ninho a merda
escorria, lambrecando o cabelo do bruxo. Talvez um resumo do próprio filme. O
abuso com a nossa paciência vem ainda do fato que o suposto personagem
terrível, o dragão, nem aparece. Ele arrasa o quarteirão do castelo dos anões,
a gente vê o rabinho aqui, umas sombras ali, no melhor estilo de filmes B. Ao
final do filme, o monstro abre o olhinho, como se dissesse: "olha: para eu
aparecer na próxima edição, precisamos outros 470 milhões; vê se vocês
comparecem e encham nossas burras!".
Os atores... Que atores? O interprete
do Hobbit é medíocre e, como o Hobbit é bobo mesmo, o ator se esconde atrás do
personagem. Os anões são todos canastrões, pareciam atores mexicanos! E o bicho
esquisito, "o que rouba a cena" ao contracenar com o Hobbit, deixa
muito a desejar. Pensei em um ator brasileiro, como Matheus Nachtergale. Se
tivesse um papel deste, Matheus lhe daria a dramaticidade de um Nosferatu. Mas
nada. Tudo uma grande bobeira. Depois de três horas sentado, saí com a nítida
sensação de haver jogado dinheiro fora, mas contribuído para que no próximo da
sequência o tal dragão apareça. Teria sido melhor se em vez de um filme fosse
um videogame. Pelo menos eu participaria das intermináveis cenas de
espadas decepando e pedras caindo.
Do outro lado:
"De pernas pro ar 2". Nacional, 6 milhões de orçamento e uma
agradável surpresa. Comedia romântica, um gênero difícil de agradar,
especialmente a mim, mas que conseguiu fazer rir em um limiar alto e mesmo
deixar lágrimas nos olhos. Algumas cenas, como uma invejosa e ciumenta Ingrid
Guimarães, quando sua personagem se corrói com as características de uma médica
prodígio se apresentando ao marido, são dignas de entrar para os registros do
cinema nacional. Toda a sequência inicial da decadência nervosa da personagem e
no spa é impecável, com um elenco de apoio muito competente e divertido e cenas
hilárias. O fato de a empresária ser bem-sucedida no ramo de falos elétricos,
vibratórios, em forma de coelhinhos ou polvos, não concentra a trama em torno
do "negócio". Em nenhum momento a comédia cai na vulgaridade, e as gozações
abrangem todos os gêneros, sem fazer humor barato ou humilhante, muito pelo
contrário, as piadas são todas de muito bom gosto.
Com exceção de Maria Paula,
que é a sucessora natural de Betty Faria, o elenco cria momentos impagáveis,
apoiado por uma direção concisa, um roteiro bem sequenciado e uma edição
dinâmica. Isso faz com que toda a sequencia final, rodada em Nova York, não
perca a linha. Um excelente filme nacional que, ao contrário do gigante bobão
americano, me deu a sensação de haver investido bem o dinheiro do salgado preço
dos cinemas de alta temporada. De alguma forma, mostra que o cinema, como
gênero de arte, está crescendo no Brasil.
Alberto Peribanez