NÃO ERA MEU DIA - Por Leo Nunes - outubro 2103



O trabalho naquele dia tinha sido intenso. Chefe no pé o expediente inteiro, o feijão da marmita azedou, o ar-condicionado da sala estava pifado, entre outros imprevistos. Era tamanha a vontade de ir embora, tomar um banho, comer algo, cair no sofá pra curtir a novela, e dormir, para que o amaldiçoado dia terminasse logo.
Dezessete e trinta, bati o cartão e corri do jeito que estava para o ponto de ônibus. Por sorte, veio rápido e não estava lotado, mas, por outro lado, nada de lugar para sentar. Entrei, paguei a passagem, encostei-me no ferro e parti rumo ao lar.

Ao chegar à Avenida das Américas, precisamente na Alvorada, subiu uma garota, que logo me chamou a atenção. Uma bela moça. Bem-vestida, cabelos longos e pretos, olhar atento, um sorriso atraente, e uma aparente simpatia, que percebi no pequeno diálogo que teve com a cobradora. Após passar pela roleta, parou, também em pé, a aproximadamente uns três metros de mim, próximo à porta de desembarque. Como o dia não estava dos melhores, evitei ficar olhando, pois, para completar, só faltava ganhar um fora de alguém.
Entretanto, percebi uma coisa que me deixou meio inquieto: ela me olhava de uma forma sutil, que começava pelo meu rosto e vinha descendo discretamente, até voltar o olhar para o outro lado. E essa sequência se repetia por várias vezes. Eu estava ficando sem graça e, de certa forma, sem acreditar que aquela princesa estaria flertando comigo. Olhei para trás, e não havia ninguém. Concluí que realmente era pra mim. Sendo assim, resolvi retribuir. A cada olhar dela, eu devolvia um sorriso, e ela virava com outro de canto de boca. E essa interação foi acontecendo de maneira que ia me encorajando para alguma reação mais ativa. Foi quando pensei em chegar mais perto e tomar alguma iniciativa. E assim resolvi fazer.
Já próximo ao Barra World, busquei todas as minhas forças e decidi me aproximar da moça. As pernas tremiam, o coração estava quase pulando pela boca, o suor escorrendo em todas as partes do corpo. Precisava de mais uma olhada, só mais uma. E ela se virou para mim, mirou meu rosto, desceu o olhar lentamente até o meu peito, e voltou o rosto para frente. Pronto! Era o que precisava. Subitamente, parti em direção a ela e falei:
– Olá! Posso saber por que a graciosa me olha tanto?
Com um sorriso irônico, ela respondeu:
– Sim! Esqueceu-se de tirar o crachá do pescoço, quando saiu do trabalho!
Imediatamente, apertei a campainha e desci do ônibus, mesmo faltando cinco pontos para chegar ao meu destino.